sexta-feira, 25 de abril de 2008


que liçoes podemos tirar da invasao do iraque...

São Paulo, 25/04/2008,



Por Dr. Frei Antônio Moser (*) Passaram-se 5 anos desde que as tropas norte americanas invadiram o Iraque. Com uma honestidade admirável os USA publicam que deram sepultura digna a uns quatro mil compatriotas seus. Admitem até que os “civis” iraquianos mortos não ultrapassariam em muito a casa dos 100 mil. Como também admitem que, considerando-se apenas o ângulo financeiro, esta guerra está custando caro: alguns trilhões de dólares. Uns a mais ou a menos dependem de como são calculados os custos. E o presidente Bush, comemora: custou, mas estamos conseguindo o que queríamos.
Em si a assertiva do Bush não é forçosamente falsa: estão conseguindo o que queriam. Só que não fica explícito o que realmente queriam. Oficialmente tratava-se de acabar, de vez com o terrorismo. Mas certamente, além da necessidade de usar armas estocadas e movimentar a grande indústria bélica, motor primordial da economia, há outros interesses em jogo. Do que hoje ninguém mais pode duvidar é de que, para justificar a invasão, foi feita uma montagem tão primorosa que convenceu quase todo mundo sobre a nobreza da ação. Só sobraram interrogações no que se refere ao verdadeiro móvel de tudo: muita maldade, muita esperteza, ou paranóia, capaz de transformar qualquer ser humano em inimigo em potencial e justificar qualquer tipo de ação considerada “preventiva”.
O fato é que um ano após a invasão todo o mundo já tinha certeza de que as terríveis armas biológicas e bacteriológicas atribuídas a Saddam nunca existiram. Elas foram, literalmente, “construídas” para justificar uma guerra injustificável. Ou então, melhor dito, elas existiam e continuam existindo, mas em outros territórios. Entretanto, esta guerra possibilita que se extraia dela algumas lições. Vamos nos limitar a uma lição por cada ano.
Primeira lição: Nunca exaltamos suficientemente as possibilidades de comunicação e até mesmo de comunhão que a mídia detêm. Infelizmente o poder que ela detém, como tudo aliás, se revela portador de uma terrível ambigüidade. Quando se deixa manipular, como ocorreu há cinco anos atrás, ela se constitui numa máquina de perversão, capaz de transformar a mentira em verdade e criar fatos inexistentes. E mesmo depois da descoberta de haver sido enganada, com poucas exceções, falta humildade para reconhecer seus erros.
Segunda lição: Em nossos dias já não se justifica nenhum tipo de invasão. Compreende-se que haja situações nas quais uma força multinacional, mas multinacional de fato, entre em ação para evitar males maiores. Este foi o caso da antiga Yuguslávia de uma década atrás. A Nato interveio para colocar ordem, e tão logo conseguiu seus objetivos, retirou todas as tropas. As nações que surgiram por um já previsível desdobramento ficaram agradecidas. Inclusive hoje passam a ser apontadas como exemplos de convivência entre inimigos aparentemente irreconciliáveis. O que não se pode compreender é que uma nação se julgue no direito de implantar sua “democracia” ao custo de milhares de vidas e trilhões de dólares.
Terceira lição: Não são só as lamentáveis doenças de cunho genético que devem merecer maior atenção. Elas afetam relativamente poucas pessoas quando se faz uma comparação com os mutilados pelas inúmeras formas de violência, das quais a mais chocante é a guerra. A invasão do Iraque não apenas sacrificou milhares de vidas, como produziu milhões de deficientes. Falar em “milhões de deficientes” não é expressão retórica, quando junto com as mutilações físicas das pessoas diretamente envolvidas, se consideram também os incontáveis mutilados em seu psiquismo, em sua afetividade e em sua moralidade.
Quarta lição: A invasão do Iraque veio comprovar, uma vez mais, a hipocrisia que comanda muitos dos aparentemente “bons sentimentos” proclamados. Por um lado se instrumentalizam os portadores de deficiências genéticas, expondo-os de tal forma que neles parecem concentrar-se todos os males do mundo. Sem negar estes sofrimentos, e sem negar a necessidade de um empenho para evitá-los ou minorá-los, desde que sejam respeitados os pressupostos éticos, não se compreende como é possível silenciar sobre aquelas legiões de mutilados que nada têm a ver com a genética, mas são produto direto da maldade humana. Nesta mesma linha de se exagerar de um lado e se tornar cúmplice silencioso por outro, convém lembrar aqui toda a movimentação feita há pouco em torno dos anencéfalos. Há algum tempo atrás parecia que todo concepto brasileiro era um anencéfalo em potencial. Agora que eles foram retirados de cena, parece que toda pessoa com um pouco mais de idade é candidata aos males de Alzheimer e de Parkinson.. Dentro de alguns meses eles serão esquecidos e outros personagens serão jogados no palco.
Quinta lição: Fica cada dia mais difícil de entender a lógica de quem, em nome da democracia a ser exportada para o mundo inteiro, implanta a maior ditadura da história até dentro de suas próprias fronteiras. Em nome da segurança criam-se mecanismos que violam os mais sagrados direitos humanos, justificando-se inclusive a tortura. Neste contexto convém não esquecer que a paranóia é uma doença terrível, que afeta não apenas indivíduos, como até povos inteiros. E o pior é que a paranóia tende a se alastrar para o mundo todo. Qualquer ser humano que se apresente é um inimigo em potencial.
Conclusão: Felizmente existem muitas outras nações que, mesmo tomando medidas de segurança, caminham no sentido contrário. É o caso da União Européia que, apesar de enfrentar não poucos problemas sobretudo em relação aos imigrantes, dá largos passos em direção a um mundo literalmente sem fronteiras. Desta forma, enquanto uns constroem muros cada vez maiores e mais vergonhosos, outros parecem haver compreendido que só há segurança onde forem construídos laços de confiança.
(*) PROF. DR. ANTÔNIO MOSER - É frade da Província Franciscana da Imaculada Conceição, professor do ITF e Assessor da CNBB para assuntos de Bioética.

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